quarta-feira, 7 de março de 2007

1ª Mostra CurtaGrav

FOTOS DA 1ª MOSTRA CURTAGRAV AQUI
CRÍTICA SOBRE A OBRA DE ERLY VIEIRA JR. (abaixo)

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O Grupo de Estudo do Audiovisual (Grav) da Universidade Federal do Espírito Santo realizará nos dias 20 e 21 de março de 2007 a sua 1ª Mostra CurtaGrav, com a exibição de curtas de todo o Brasil. O evento acontecerá no pátio interno do Cemuni V, no Centro de Artes da Ufes, a partir das 19 horas. A entrada é franca.

No primeiro dia (20/03 - terça-feira) serão exibidos diversos curtas inéditos no Estado. No segundo dia (21/03), uma retrospectiva com a exibição de quatro curtas do diretor Erly Vieira Jr, que estará presente para comentar sobre suas obras e carreira. Na ocasião, será distribuído um pequeno catálogo que analisará as obras do diretor homenageado.

O quê? Mostra CurtaGrav
Quando? 20/03 (terça) e 21/03 (quarta)
Que horas? 19 horas
Por que? Curtas nacionais e retrospectiva Erly Vieira Jr.
Quanto? Gratuíto
Onde? Pátio interno do Cemuni V, Ufes, Vitória

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CONFIRA A PROGRAMAÇÃO

Dia 20/03
O Xadrez das Cores, de Marco Schiavon (RJ)Sinópse: Cida, negra, vai trabalhar para Maria, viúva e sem filhos, que é extremamente racista.
Festivais: Melhor Filme no Festival de Cinema, Melhor Curta no Festival de Miami, Melhor Curta Festival de Curitiba, Melhor Atriz no Fetsival da Bahia, Los Angeles Intl Short Film Festival e outros.








21A, de Ananda Guimarães (SP)
Sinópse: Três jovens acham fotos rasgadas na lixeira. A partir daí, tem início um divertido jogo de adivinhações e estórias.
Festivais: Melhor Filme pelo Juri Popular no Festival Nóia 2005, Festival Internacional de Curtas de SP, Festival de Brasília de Cinema, Festival Brasileiro de Cinema Universitário e outros.



Louise, de Carlos Augusto de Oliveira (Dinamarca)
Mais informações em breve




Na Corda Bamba, de Marcos Buccini (PE)
Sinópse: Um palhaço observa a cidade na corda bamba.Festivais: Melhor Animação no Euroshorts 2006 (Polônia), Gramado Cine Vídeo, Festival de Pernambuco, São Carlos VideoFestival, Festival de Natal e outros.



Rosália, de Arthur Tuoto (SP)
Sinópse: Rosália gosta do som dos seus próprios passos. Rosália procura e caminha. A cidade é uma pilha de entulhos.




Tyger, de Guilherme Marcondes (SP)
Sinópse: Um enorme tigre aparece misteriosamente numa grande cidade. Ele vai revelar a realidade escondida numa noite que poderia ter sido como qualquer outra.Festivais: Prêmio de Melhor Direção no Anima Mundi, Festival de Leipzig
(Alemanha), CurtaCinema (RJ) e outros.











O Ditado, de Tomás Creus (RS)
Sinópse: Durante um ditado na escola, um menino não consegue se concentrar, perdido no seu mundo imaginário.
Festivais: Melhor Animação no Vitória Cine Vídeo, Gramado, Mostra do Filme Livre, CineEsquemaNovo e outros.




Dia 21/03Retrospectiva Erly Vieira Jr.
(Leia entrevista exclusiva abaixo)

Macabéia
Finalizado em 16mm, 19 min, 2000.
Sinópse: Imagine a Macabéa. Sem graça, parada na vida... Como seria a vida dela nos dias de hoje?
Direção: Erly Vieira Jr, Lizandro Nunes e Virgínia Jorge
Prêmios: Melhor curta-metragem 16mm, melhor roteiro e melhor atriz, Gramado, 2001; Menção Honrosa, 34º Festival de Brasília, 2001; Prêmio de Contribuição Artística, 6º FBCU, UFF, 2001; Prêmio Especial do Júri, VII Vitória Cine Vídeo, 2000.; Roteiro vencedor do I Concurso de Roteiros / Vitória Cine Vídeo, 1998.


Pour Elise
Finalizado em 35mm, 15 min, 2004.
Sinópse: Esta é a história da jovem Elisa e de sua tia que vive no asilo, Ana. Ou não.
Direção: Erly Vieira Jr.
Festivais: Vitória Cine Vídeo (2004); São Luis, Varginha, Festival Internacional de Curtas de Belo Horizonte (2005) e Cine Esquema Novo (Porto Alegre), 1º Festival Multimídia de Cultura Livre do Brasil (Porto Alegre) e Festival Brasileiro de Cinema Universitário (2006)


Saudosa
Finalizado em 35mm, 15 min, 2005.
Sinópse: Nem tudo em Saudosa é ficção.
Direção: Erly Vieira Jr e Fabrício Coradello.
Prêmio: Melhor Ficção no II Tudo Sobre Mulheres (Mato Grosso/ 2006).
Festivais: Vitória (2005); Corta Curtas (Itaú Cultural, SP), São Luís, Florianópolis, Tudo sobre Mulheres (MT), MoVA Caparaó (ES) (2006)


Grinalda
Finalizado em mini-DV/DVD, 11 min, 2006
Sinópse: Nem todo homem é que nem Charles Aznavour. Ex-marido, então, muito menos.
Direção: Erly Vieira Jr.
Prêmio: Melhor Vídeo pelo juri popular no Vitória Cine Vídeo 2006.
Festivais: Vitória (2006), Mostra Transborda (ES, 2006), Teresina (2006), Palmas (2006), Atibaia (2007), Mostra do Filme Livre (RJ, 2007)

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ENTREVISTA COM ERLY VIEIRA JR

- Produzir seu primeiro filme, Macabéia, revelou um novo modo de encarar o cinema? Você passou a ver os filmes de uma nova maneira?
Por trabalhar tanto na área literária quanto na audiovisual, eu prefiro dizer que eu gosto é de investigar esse desejo da gente de contar histórias, de ficcionalizar o real de formas tão ricas e pelos mais diversos motivos. Quando eu comecei a experimentar a narrativa audiovisual, acabei por descobrir um prazer em testar alguns de seus limites (essas fronteiras aparentes entre real/imaginário, ficção/documentário, verdadeiro/falso, primeira/terceira pessoa, texto original/intertextualidade) e, à medida em que ia mergulhando nesse processo, passei a valorizar mais os filmes que buscam nublar/investigar/confundir essas divisões.
- A derrubada da fronteira entre o real e o imaginário é latente em dois curtas seus, Pour Elise e Saudosa. Por que essa busca?Confesso que tenho predileção por três coisas quando faço filmes: ironia, intertextualidade e metalinguagem. Ironia porque é a melhor forma de se interpretar o mundo que nos cerca, explorar suas contradições, explicitar o que nos incomoda ou fascina. Intertextualidade não só no diálogo com outros textos (filmes, livros, produtos da cultura pop, canções, narrativas orais) mas também com textos pessoais, com experiências e episódios anteriormente vividos por mim (e pelos co-diretores e co-roteiristas), pelos membros da equipe técnica e, principalmente, pelos intérpretes dos personagens (sejam eles atores ou não-atores). E a metalinguagem porque ela o tempo todo costura esse jogo de esconder e revelar esses intertextos, na intenção de fazer o espectador questionar o tempo todo o grau de veracidade ou ficcionalização do que ele vê. Ao optar trabalhar com essas três instâncias, vejo que é uma conseqüência natural brincar com essas fronteiras, e convidar o espectador a tentar ultrapassá-las comigo. Inclusive, eu incluiria "Grinalda" nesse rol, por dar continuidade a esse processo sob outras formas.

- Nos primeiros curtas, há um cuidado estético enorme com enquadramentos, aspecto que você explora mais instintivamente em Grinalda? Como é essa mudança?
"Grinalda" foi uma tentativa de pensar na câmera como uma espécie de caneta, buscando captar a espontaneidade do improviso da intérprete (Letícia Braga) camuflada num depoimento que, em seus momentos iniciais soa verídico, para logo em seguida assumir-se como impostura, como farsa. "Grinalda" dá continuidade à pesquisa que eu e o Fabrício Coradello iniciamos em "Saudosa", só que desta vez a relação sustenta-se diretamente no confronto entre o diretor (também operador de câmera e microfone) e a atriz. Eu a provocava verbalmente, ela reagia, eu tornava a provocar a partir de uma brecha em seu discurso, e assim o monólogo se constituía. "Macabéia" e "Pour Elise" foram filmes com quase nenhuma improvisação no momento da captação de imagens, daí a utilização de uma decupagem previamente estabelecida e ensaiada. "Saudosa", que simulava o método de um documentário, já trabalhava a possibilidade da câmera ser conduzida pelos depoimentos do personagens, embora houvesse ao menos um ponto de partida de cada um deles, previsto no roteiro. "Grinalda", não. Não tinha ponto de partida definido, muito menos de chegada. A relação se construía à medida em que o plano era rodado. Foi a primeira vez que eu operei a câmera num trabalho meu, e tive que reenquadrar à medida em que ia gravando, seguindo o fluxo das interações com Letícia. Nessa hora, tive que me virar, e lançar mão o tempo todo de meu repertório audiovisual adquirido nesses poucos anos de realizador (e nos quase quinze anos de cinefilia), agindo quase institivamente.

- Por que Erly Vieira Jr. se mostra nos próprios filmes?
Começou como uma pequena brincadeira em "Macabéia". Mas, se pensarmos que a cada filme (mesmo nos co-dirigidos) eu tenho tentado trazer experiências e questionamentos bem pessoais para dentro deles, obtendo de diversas memórias e eventos já vividos os pontos de partidas para as incursões ficcionais, por que não fazer da minha própria figura parte desse jogo?

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ATUALIZAÇÃO

Erly Vieira Jr.: O cinema na fronteira
Por Rodrigo de Oliveira

Diante da filmografia de Erly Vieira Jr., não parece difícil perceber sobre o que cada trabalho quer extrair daquilo que encena e propõe. Há em toda a obra um desejo aberto pelo processo de fabricação do cinema, filmes que são making of de si mesmos; uma disposição em construir os dramas a partir do contato íntimo com a natureza dos personagens centrais (todos eles femininos), e assim se deixar contaminar por tudo aquilo que encante ou desafie estas pessoas, tornar os sentimentos de um protagonista também os sentimentos do filme que se faz sobre ele; trabalhar sempre num registro entre a ironia e a ilusão, nunca propriamente naturalista. Mas se podemos saber como os curtas de Vieira Jr. se apresentam aos nossos olhos, nunca temos certeza total do lugar em que se apóiam. Talvez porque Macabéia, Pour Elise, Saudosa e Grinalda não sejam narrativas de instalação, mas filmes que respiram a oportunidade de não ter um território próprio e definitivo. Estamos tratando de um cinema que vive limites, que nasce na intersecção de vários campos artísticos. Seu lugar não é na ficção ou na realidade, no drama ou na comédia, no presente ou no passado, mas exatamente nas fronteiras traçadas entre um e outro.

Nos dois primeiros filmes essa idéia de fronteira é tomada como tema, e veremos em Macabéia (1999) e Pour Elise (2004) a materialização desses limites nas protagonistas. Marluce, a do primeiro, nasce do contato entre duas instâncias de autoria. De um lado temos Clarice Lispector, e do outro três jovens diretores de cinema (além de Vieira Jr., também Lizandro Nunes e Virgínia Jorge) que se apropriam do livro não só enquanto o testemunho textual de uma trajetória de vida, mas como a possibilidade de enxergar ali dentro outros caminhos, às vezes até opostos aos da obra original, mas de alguma forma já contidos nela. A via paralela à literatura é o mergulho naquilo que há de mais substancialmente cinematográfico, e o destino de Macabéia, travestida de Marluce, parece por um momento ser o mesmo no livro e no filme: é o que nos faz supor a conversa amistosa entre a protagonista e seu namorado, final reconciliatório interrompido por um atropelamento. Mas não é Marluce ali deitada no chão, sangrando pela boca, como um dia acontecera com Macabéia, e o uso do suspense, da tragédia que apenas ouvimos, mas já supomos ser real, serve mesmo para ratificar a decisão da moça em abandonar aquela vida de infortúnios. Marluce também esteve o tempo inteiro numa zona limítrofe, entre a descrença e a certeza de um futuro. Sua hora da estrela, no entanto, já tinha sido alterada, por sua própria vontade. Numa simpatia de nós na fita do Senhor do Bonfim esteve, desde o começo, a discussão sobre as fronteiras da fé.

Pour Elise vai além. Tendo a fé sido absorvida enquanto uma possibilidade real de transformação dos destinos (Macabéia morta x viva), agora não só o futuro será elemento ativo de construção das trajetórias destes personagens. Temos uma tia num asilo e sua sobrinha, restabelecimento de um contato geracional perdido. Entre as quinquilharias acumuladas pela velha e as investidas da sobrinha por este universo íntimo-histórico do qual nunca tomou parte, seremos colocados no limite entre a memória e sua atualização, e há, nos passeios de barco que as duas fazem pelo tempo, menos um delírio de fundo saudosista que uma verdadeira apresentação a um novo mundo, tão real e palpável quanto as caixinhas de música ao longo do filme. A tia leva a sobrinha ao passado; morre, e assim permite que a menina assuma seu lugar, mas não apenas enquanto figura borrada numa fotografia antiga. Elisa encerra em si a memória, a atualidade e a projeção de um futuro (o relacionamento perdido com o rapaz de cachecol vermelho é finalmente recuperado), e posa como guardiã ativa destas fronteiras do tempo.

E sendo exatamente a fé e o tempo os mais fundamentais elementos da experiência cinematográfica (diante de um filme é preciso, acima de tudo, crer em sua capacidade de encapsular a temporalidade da vida e reproduzi-la num negativo), no terceiro trabalho do diretor já não teremos mais um desdobramento meramente temático: Saudosa é a própria fronteira, uma espécie de reportagem do momento em que dois autores (o filme é co-dirigido por Fabrício Coradello) se chocam com a vida, e desse contato direto, da explosão surgida a partir dele, nem ficção nem documentário, mas o próprio cinema, sem disfarces, paira soberano, ele mesmo de natureza puramente fronteiriça – mistura de todas as artes, mas ao mesmo tempo arte única entre elas. Há um deslumbre incontido com a oportunidade de trafegar pela realidade e pela invenção, estabelecer uma falsa diferenciação entre as duas (um depoimento “real” do suposto documentário sobre a poetisa Saudosa sempre é precedido pelas instruções que os diretores dão aos personagens da vida real sobre o que devem “testemunhar”) para, no fundo, defender sua hibridização, atestar que por dentro delas corre um mesmo sangue, algo que poderíamos chamar de “verdade”, não como valor absoluto, mas como antídoto à idéia de uma “mentira”. Saudosa, a personagem, é tão verdadeira quanto a disposição dos diretores em inventá-la. Saudosa , o filme, tem nas veias o Cinema com C maiúsculo, essa verdade a 24 quadros por segundo.

Grinalda é a saída mais corajosa de uma cinematografia que chegara, ao final do terceiro filme, à própria natureza e materialidade do discurso artístico em que se inscrevia. Aqui várias das noções espalhadas nos trabalhos anteriores são radicalizadas. Isto só é possível porque a instância autoral deixa de ser auto-reflexiva (lembremos da cena de Macabéia em que Marluce se arruma para o reencontro com o namorado, uma colagem de momentos em que a atriz ri, olha para a câmera, brinca com a equipe do filme, ou ainda dos três velhinhos que são os verdadeiros fabuladores da trama de Pour Elise, e que na cena final recebem a visita de um quarto, o próprio Erly Vieira Jr., e também de toda a construção de Saudosa, onde a figura dos diretores merece o mesmo registro que as ficções que ali se estão apresentando). Grinalda não é mais o estudo sobre os limites da representação, como haviam sido os outros filmes. As fronteiras parecem ter sido suficientemente desbravadas, e aqui Erly Vieira Jr., pela primeira vez, admite um território, se instala num lugar que é o do próprio cinema e de suas possibilidades. O que Grinalda parece nos dizer é que qualquer filme é sempre um documentário sobre a ocorrência da ficção no mundo: estamos diante de uma grande atriz, Letícia Braga, num exercício livre de improviso, e cabe à câmera não mais que testemunhar esta pessoa da vida real criando, minuto a minuto, novos personagens da vida imaginária, e cabe ao diretor não mais que eventualmente estimular esta invenção através de artifícios claramente definidos (uma visita a um cemitério, saquinhos de chá com fotografias). Chegamos a uma espécie de pedra fundamental do cinema contemporâneo, que precisou de todo o trabalho dos cinemas anteriores na investigação dos limites entre vida e arte para, finalmente, poder se estabelecer, anos 2000 batendo à porta, como o espaço privilegiado para a implosão desta distância. “É tudo uma coisa só”, parece nos dizer o trabalho de Erly Vieira Jr. E assim, sem diferenças, tudo fica muito mais divertido.

Um comentário:

Unknown disse...

tá ótimo vitor, vou postar o link lá no site...